quarta-feira, 8 de junho de 2011

In memoriam (filho de Gaia)

Penso.
Penso mais.
Mais.
Olho para baixo e vejo meus dedos digitarem este texto.
Pensei em dizer aquilo, mas talvez aquilo outro seja melhor aqui. Não que haja segredos, até porque publico todos sem discriminação - certo ou feio - são, vão e pronto.

Tracejo.
Calmo e estúpido, impoluto.
Tracejo:
Boca.
Nariz.
Olhos.
Orelhas.

A boca, os olhos e as orelhas são mais difíceis, refaço, rasgo, xingo, vou mijar, volto, ascendo a luz da vela, xícara, vinho, depois café.

Sigo.

Memória experimental, bêbada, risonha, me passa a faca preu rasgar o pão. Rasgo:

Havia uma pia, nela a bunda, o rasgo, o amasso, a língua. O não e o não, o não gritando desesperadamente que sim - sabíamos do estrago - de pé rolávamos. 

Pratos facas garfos colheres
levitavam todos
lentos
mudos todos
esbarravam-se
caiam todos
inteiros todos

Não levitava eu e você
Que corações amargos, pesados
Soluçam penumbram apenas
Fazem da vida instante agora, cacos

Posso lhe dizer que me curei. Você?

Pausa.

É tarde, o sol está lá nascido a 3 horas, a cama e você desarrumadas, tão clarinhas e lindas as duas - naquele momento quis grudar os olhos no teto, apesar que podia eu imaginar ver você assim do alto, um desenho desalinhado harmônico - lençóis brancos sobre o corpo teso de mulher de 27 anos. Do teu lado direito, no chão, estava lá meus ossos cobertos por esta capa de pele e pelos que chamam, que chamo de Eu e o colchão magro e duro, cansado.

Soluço.

E tudo aquilo se desfaz como a rapidez da luz, o cheiro de agora é de um café apressado, quase calado, estamos na mesma cozinha clara beje, nada levita, nem mesmo os aromas de café e pão, que parecem até rastejar-se pelo chão, como quem fojem.

Bagunço as idéias.
Digo: não direi uma só palavra sobre esta despedida, sobre este corredor feio estreito, sobre aquela escada e seus degraus, sobre você. Direi de mim, que é o que sei.

E o poema me escorreu pelas pernas, manchando as vestes, o mais prematuro dos prematuros, meu aborto, meu coito.

Tracejo.
Sobrancelhas cabelos pescoço...

quinta-feira, 2 de junho de 2011

                                                                                          Para Daniela Sophie
sei, andei e ando

                            sem ti
                                      do
                               que
 me
                               serve

esta palma da mão
esta
        anotação
                       na
                           palma
                           da
                           memoria

e ando
e amo

                                        respiro

eu acredito
eu insisto
eu infinito
                eu morto
           eu dentro do seu corpo
     eu grito
            gemo
                     eu lembrança
                     você cheiro


calmo                                          só

                    na falta
                    do que
                     nunca
                      tive

pai mãe irmãos amigos

                                    aqueles
         que no desespero
         aqueles
                     que no berço da saudade

gritei
chorei
liguei
rezei


        e fui feliz


(Ao som de René Aubry - Invites sur la terra)